Prof. Amauri Mascaro Nascimento (in memoriam) discute as transformações do direito trabalhista.

O Direito do Trabalho do século XXI
Amauri Mascaro Nascimento (in memoriam)[1]

O Direito do Trabalho, na fase atual, é uma obra inacabada. Sua finalidade básica, como desde o seu início, é a proteção jurídica do trabalhador e a tentativa da diminuição das desigualdades sociais.

Porém, está enfrentando novos dilemas, pois que não são essas suas únicas finalidades, existindo também outras.

O Direito do Trabalho deveria denominar-se “Direito das Condições de Trabalho”, conceito mais amplo, que atenderia à perspectiva da bilateralidade do contrato de trabalho e explicaria melhor a sua função objetivadora de normas que se inserem no ordenamento jurídico e que o afasta da subjetividade de um direito de classe que não se compatibiliza com o que na realidade ele é.

A questão é: deve ele reger todos os contratos continuativos de atividades prestadas pela pessoa física na sociedade ou deve se ater a um único tipo padrão, o trabalho subordinado?

Há, disciplinados pelo Código Civil, contratos de prestação de serviços autônomos, de transporte, de agência ou representação comercial, de corretagem, de mandato, de administração, de cooperados e outros. Quando o prestador é pessoa física e o destinatário é empresa, podem confundir-se com o contrato de trabalho. Essas relações jurídicas devem passar para a esfera do Direito do Trabalho?

Na Europa, com a União Europeia, surgiu o Direito do Trabalho comunitário. Com a desintegração da URSS, desapareceu o Direito do Trabalho como “ditadura do proletariado”.

O Direito italiano está revendo as categorias básicas de relações individuais de trabalho, conforme nos ensina Santoro-Passarelli (2002). O binômio trabalho subordinado e trabalho autônomo não é considerado, no Direito peninsular, suficiente para abranger a imensa tipologia da realidade diversificada das relações de trabalho.

Foram criadas figuras intermediárias entre o trabalho subordinado e o autônomo: a parassubordinação e a coordenação. Esta última tem um desenho incompleto, próximo, mas que não se confunde com a subordinação.

Por outro lado, há profissionais que não têm necessidade de proteção da lei, como diretores e altos administradores de empresas. Para esses profissionais, é mais importante o contrato e as vantagens maiores que oferece, não tendo tanta importância os direitos previstos em lei.

As empresas de pequeno porte não devem ser tratadas do mesmo modo que as demais. No Brasil, essas empresas têm assegurado tratamento favorecido desde que constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País (CF, art. 170, IX). Não conseguem elas responder pelas mesmas obrigações previstas nos convênios coletivos para as grandes empresas.

A Espanha aprovou um Estatuto de Trabalho Autônomo (2007). A Itália (Lei Biagi, de 2003) flexibilizou os contratos de trabalho. Portugal aprovou um Código do Trabalho (2003). A China (2008) aprovou a sua segunda lei trabalhista que não tem maiores aspirações.

Eclodiram movimentos sociais paratrabalhistas, assim compreendidos aqueles em que a pretensão não é exclusivamente de leis trabalhistas, mas de outros temas sociais.

Os direitos fundamentais e de personalidade do trabalhador são, cada vez mais, protegidos. A defesa da vida, da saúde, da integridade física e da dignidade do trabalhador tornam-se tão ou mais importantes do que a dos direitos econômicos.

Esses aspectos vêm transformando a fisionomia do Direito do Trabalho.

[1] Originalmente publicado em: NASCIMENTO, Amauri Mascaro, NASCIMENTO, Sônia Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2018, 41. ed. p. 54-5.

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