Dr. Júlio Mendes questiona se diferença de verba rescisória reconhecida em juízo acarreta multa

Direito do Trabalho
Diferença de verba rescisória reconhecida em juízo implica pagamento de multa pelo empregador?
Júlio Mendes

A Justiça do Trabalho tem recebido ações veiculando situação na qual o trabalhador formula pedido de pagamento de diferença de verba rescisória por entender que o montante constante no seu termo de rescisão contratual é inferior ao efetivamente devido.

Por esse motivo, também formula pedido de pagamento de multa pautado na argumentação de que as verbas em comento não foram pagas na sua integralidade e dentro do prazo fixado em lei.

Surgem, então, as seguintes indagações:

  • A diferença de verba rescisória reconhecida em juízo implica pagamento da multa prevista no art. 477, §8º, da CLT?
  • Em caso positivo, no que diz respeito à incidência de multa, a ausência de pagamento de verba rescisória no prazo devido se equipara à hipótese de diferença de pagamento decorrente de decisão judicial?

O caso em tela tem se repetido no cotidiano e, à primeira vista, pode dar conotação de que a resposta é simples e uniforme no sentido de o empregador ser obrigado a arcar com o pagamento da multa independentemente da hipótese (ausência de pagamento ou pagamento de diferença oriunda de comando judicial).

Tal resposta, contudo, não é tão simplória o quanto parece.

Para responder os questionamentos sob análise é preciso examinar os contornos da legislação aplicável ao caso bem como o posicionamento da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST), responsável por unificar a interpretação da legislação trabalhista.

Pois bem, prevê o art. 477, §6º, da CLT (alterado pela Lei 13.467/17) que os valores constantes no termo de rescisão do contrato de emprego devem ser pagos em até dez dias, a contar do término do contrato de trabalho.

A inobservância dessa diretriz implica a incidência do §8º, também do art. 477, da CLT, o qual impõe ao empregador o pagamento de multa a favor do empregado em montante equivalente ao seu salário. Prescrevem tais dispositivos:

Art. 477 – § 6º – A entrega ao empregado de documentos que comprovem a comunicação da extinção contratual aos órgãos competentes bem como o pagamento dos valores constantes do instrumento de rescisão ou recibo de quitação deverão ser efetuados até dez dias contados a partir do término do contrato.
§ 8º – A inobservância do disposto no § 6º deste artigo sujeitará o infrator à multa de 160 BTN, por trabalhador, bem assim ao pagamento da multa a favor do empregado, em valor equivalente ao seu salário, devidamente corrigido pelo índice de variação do BTN, salvo quando, comprovadamente, o trabalhador der causa à mora. (Grifos acrescidos).

A primeira conclusão que se extrai da conjugação dos referidos §§6º e 8º é: na hipótese de o empregador não efetuar o pagamento das verbas rescisórias no prazo legal estará ele sujeito ao pagamento da multa.

Trata-se de situação na qual o empregador é que dá causa à mora, pois não efetua pagamento algum das verbas rescisórias dentro do prazo fixado pela CLT (dentro de dez dias do término do vínculo empregatício).

Neste caso, não há dúvida quanto a ser devida a multa pelo descumprimento da obrigação imposta pela lei.

Por outro lado, tem-se a situação que gera maior polêmica: quando o empregador efetua o pagamento das verbas rescisórias dentro do prazo legal, mas o trabalhador obtém decisão judicial determinado o pagamento de diferença de tais verbas.

A dúvida que se revela neste caso é: essa situação equipara-se à anterior (ausência de pagamento) a ponto de também fazer incidir o pagamento de multa?

Pela leitura dos §§ 6º e 8º, do art. 477, da CLT, não se extrai diretriz prevendo, também, a hipótese de pagamento de multa quando a diferença de verba rescisória é reconhecida em comando judicial. A lei não abarca essa situação.

A multa em comento concerne à penalidade por inobservância de regramento fixado em lei. Logo, a interpretação mais razoável à luz da hermenêutica jurídica revela que se deve atribuir ao comando legal (art. 477, §§6º e 8º, da CLT) interpretação restritiva.

Dessa forma a sanção imposta ao empregador (multa) deve se restringir à hipótese de ausência de pagamento no prazo legal.

Com efeito, a situação acima não se equipara àquela na qual o empregador realiza o pagamento de verba rescisória dentro do prazo legal, e, em momento posterior, o Poder Judiciário reconhece a existência de diferença a ser paga a tal título.

Neste caso não há incidência da multa prevista no §8º, do art. 477, da CLT. Essa interpretação é compatível com o posicionamento adotado pelo C. TST por meio da SBDI-I (TST-E-RR-68700-41.2011.5.17.0132) em decisão proferida em 2018.

Recentemente (agosto de 2019), foi publicado acórdão proferido pela 8ª Turma do TST (TST-RR-11803-05.2014.5.15.0015) reiterando a diretriz interpretativa adotada pela SBDI-I quanto a ser devida a multa em face de empregador que não paga as verbas rescisórias no prazo legal e, por outro lado, afastando a incidência na hipótese de pagamento insuficiente.

Diante desse contexto legal e jurisprudencial é possível concluir que a ausência de quitação de verbas rescisórias no prazo legal não se equipara à situação de diferença a ser paga a tal título em razão de decisão judicial. Portanto, haverá incidência da multa prevista no art. 477, §8º, da CLT apenas no primeiro caso.

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